20 de fev. de 2011

19 de fev. de 2011

sorriso demente

Um sorriso cínico
a caminhar flutuante
cruza o jardim;
aproxima-se e atravessa
a vidraça da minha janela
– vem dizer que chegou.
Não precisava.
Já tinha ouvido pelo ralo da cozinha
todo aquele murmurinho
brotando vivo subindo
pondo a correr baratas
seus cheiros e desejos.
E chegou.
Informalmente se instala;
abre as cortinas
puxa almofadas e
estende-se no sofá.
Está lá.
Ficará novamente
por noites insones
sorridente de dente demente
dizendo
Aqui estou...
Não precisava.

18 de fev. de 2011

contrastes contidos contigo

a primeira visão foi no escuro dum cinema. pelo recorte de silhueta algumas fileiras adiante, tela em luz ao fundo. o cabelo em corte prático e de irrequieto parar, por tão liso. feito fotogramas: flashes um a um. depois, posta de pé, surge o corpo delgado e de frágil aparência. para logo se fazer voz: pausada, de timbre algo metálico, emoldurada num constante quase sorriso, entre tímido e moleque. em seu autocontrole e clareza, logo põe em dúvida a aventada fragilidade. estava mais para uma autonomia de inesperadas características. mas quais?

restou a direta pergunta: quem és tu? quem és tu a me mobilizar em meio à penumbra fílmica, estilhaçando roteiros já assistidos?

e deu-se a resposta, “num fluxo de pensamentos”:

Estou sendo, uma vez que resultado da minha vontade, dos perceptos e das forças que me atravessam sem paragem numa velocidade infinita. Acerca disso, atribuo sentidos e significados que cambaleiam na tentativa de se tornarem fixos. Mas isso é praticamente inviável, ao passo que a vida em movimento transforma e arrebata todos os conceitos. Vicissitudes, enleios e desejos – é isso que sou. Um emaranhado de pensamentos em busca de nomes para os objetos do conhecimento. É neste conflito que me faço, me recrio e desloco. Sinto-me ansiosa, embora anseie poucas coisas. Sonho em conhecer mundo além dos livros. Quero ainda cantar libertamente com a minha voz rouca. Gosto de compartilhar as coisas na minha hora, dormir bastante e sem demora. Para mim a vida parece simples na sua complexidade – pena a nossa consciência ser uma tragédia e uma angústia que alerta a inquietude diante da nossa finitude [...]. O sol me incomoda na sua intensidade. E o excessivo barulho me causa dores de cabeça. Tento ser responsável e acho possível reconstruir algo que valha a pena. Nesse sentido, procuro não deixar escorrer por entre meus dedos as possibilidades criativas e novas formas vida. Acho que o humano possui uma potência e, sendo ele atento e sensível àquilo que o circunda, é capaz de efetivar suas perspectivas em ato, em um estado que pulsa para algo pleno. Acho que é isso que estou sendo – mas não para, não cessa, até...

e ela ainda canta, filosofa, gosta de outras meninas e, sim, é uma graça.

16 de fev. de 2011

singrando o Negro

estrelas gotejam no céu vítreo amazônico. a projetar origens, o regional singra o Negro, a noite, a vidraça, a floresta hipnótica sempre ao largo.
.....artifícios, esquadro, janela, o recanto em uma casa, um acalanto fictício. águas de uma cidade que nunca deixaram de passar. sementes negras em promessas de um dia me levares contigo.

4 de fev. de 2011

diálogos recortados [in continuum]

“Já em novembro havia lhe dito: todas as verdades podem ser satisfeitas neste planeta. Nele, tudo é permitido. Você pode até achar estranha a afirmação, mas pense bem: nada seria como é – caótico – se aqui na Terra não houvesse essa permissividade toda.”

Mas tudo é muito. Fica por demais aberto...

“Sim. Mas voltemos então a setembro: ninguém escapa ao próprio destino, porque ainda que haja total perdão e redenção não se poderia superar a responsabilidade de libertar o que a própria alma amarrou. Você quer liberdade? Então liberte todo mundo!”

Não é um tanto quanto vago, tudo isso?

“Pois comece a se pensar como uma pessoa diferente daquela que um dia foi. Para isso será necessário que você torne irrelevante a memória de tudo que ocorreu, prestando mais atenção ao que você pode fazer a partir de agora.”

Fechei o jornal, me pondo a imaginar como agir de modo nunca antes aventado como possível...

Bem, se o “poder de realizar através do esforço” é a única e verdadeira facilidade com que minha alma pode contar – como depois viria a me dizer –, resulta que não dependerei das circustâncias para atingir o objetivo desejado. Eu próprio serei o objetivo.